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comprovante

“As políticas macroeconômicas-incluindo as políticas monetárias-têm em grande medida limitadas pela ideologia, e é a ideologia fundamentalista dos mercados que serve os interesses do topo, muito à custa do resto da sociedade.” (Joseph Stiglitz, O Preço da Desigualdade)

Como medida destinada a combater o atual déficit fiscal, o Governo Michel Temer mobiliza a sua maioria no Congresso Nacional pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 241/2016 (PEC 241), que propõe o congelamento das despesas primárias da União por 20 anos. De acordo com a proposta, as despesas realizadas em 2016, atualizadas monetariamente pelo IPCA, constituirão teto para as despesas em 2017. E assim sucessivamente pelos próximos 20 anos. Ao limitar a proposta apenas às despesas primárias, deixando de fora o pagamento da dívida pública, o Governo Temer reserva para os credores do Estado todo o crescimento econômico que o Brasil vier a conhecer nos próximos 20 anos, constitucionalizando, a partir da proposta de um governo não eleito e por meio da legislatura mais comprometida com os interesses dos seus financiadores – fenômeno que não deve se repetir na mesma proporção nas próximas composições do Parlamento, a se confirmar a esperada redução do financiamento empresarial –, uma decisão que deve ficar a cargo do legislador orçamentário a partir das prioridades definidas pela sociedade, ano a ano.

Ou seja, se a PEC for aprovada, o Governo não eleito pelo povo e o Congresso que o colocou no poder, estabeleceriam as prioridades para todos os próximos governos escolhidos pelos eleitores: apesar do aumento da população, das demandas sociais, do incremento das necessidades de atendimento das políticas públicas, não será possível elevar despesas acima da inflação. Todo o crescimento real da arrecadação verificado será canalizado para uma única finalidade: o pagamento de dívida pública. Se já não bastassem consumir atualmente cerca de 40% do orçamento federal, os rentistas serão brindados por todo o crescimento da arrecadação pelos próximos 20 anos.

É evidente que tal iniciativa causa prejuízos gravíssimos às opções fundamentais estabelecidas pela Constituição Federal de 1988, decretando a morte do Estado Social em nosso país, e o abandono dos objetivos fundamentais da República de constituir uma sociedade livre, justa e solidária, de erradicação da pobreza e da marginalização, de redução das desigualdades sociais e regionais e da promoção do bem de todos (art. 3º, I, III e IV, CF), a partir da impossibilidade de dar atendimento, nos já insuficientes patamares atuais, às despesas de saúde e educação, eleitas pelo constituinte originário como direito de todos e dever do Estado (art. 196, e 205, CF), e por isso merecedoras de percentual mínimo no orçamento definido na Constituição (art. 198, §1º e 212, CF), que estão sendo flexibilizados pela PEC, bem como de previdência e de assistência social, a que a todos a Constituição dirigiu de forma irredutível (art. 194, parágrafo único, II e IV, CF).

O quadro é bem mais grave do que as palavras e os editoriais podem revelar. De acordo com os dados divulgados em estudo de Flavio Tonelli Vaz (http://diplomatique.org.br/artigo.php?id=2144), se a proposta estivesse em vigor desde 2005, hoje as receitas de educação seriam um quarto do orçamento efetivamente realizado no ano passado. Na seguridade social, o mesmo raciocínio levaria a uma redução de 40%. Como se vê, aprovada a proposta, teremos uma drástica redução das prestações de saúde e educação no Brasil. Se hoje já estamos muito longe dos objetivos constitucionais, o retrocesso das referidas prestações sociais será incomensurável, comprometendo a vida, o desenvolvimento e a felicidade de toda uma geração. É como jogar fora o nosso futuro!

É claro que, como adverte o vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 2015, Angus Deaton, na obra The Great Escape: Health, Wealth, and the Origins of Inequality, os ricos têm muitas razões para apoiar tais cortes pois não necessitam de educação ou de assistência de saúde prestadas pelo Estado, mas a democracia resta comprometida com a perda de bem-estar pela população mais pobre, que deixa de identificar razão para participar da vida política do país.

A justificativa apresentada pelos Governo erigido pelo Congresso Nacional para tais medidas de austeridade é a salvação das finanças públicas no Brasil, proporcionando um ambiente de maior confiabilidade para os investidores, a fim de promover o crescimento econômico e o emprego. Segundo o lema governamental, é preciso sair do vermelho!

Porém, como adverte o ex-ministro da Fazenda no Governo Sarney, e da Administração e Reforma do Estado no Governo Fernando Henrique Cardoso, Luiz Carlos Bresser Pereira (http://www.ocafezinho.com/2016/10/10/bresser-pereira-pec-241-e-o-desmonte-do-estado-social-brasileiro/), não há uma crise fiscal estrutural que autorize medidas que comprometem as opções do Estado brasileiro por tanto tempo. Afinal, a proposta de emenda constitucional, longe de procurar sanar dificuldades conjunturais sempre a cargo do legislador orçamentário, amarra as decisões de legisladores e governantes futuros. Assim, não condiciona o teto de gastos primário ao desempenho da arrecadação ou da economia brasileira, em um contexto normativo em que, é claro, tais medidas não impedem, pelo menos diretamente, que a economia brasileira se recupere e volte a crescer. O que a proposta faz é, a partir do pretexto da austeridade oferecido pela crise fiscal, promover uma aceleração do processo de transferência de renda do conjunto da sociedade brasileira para o setor financeiro, que passaria a ser o destinatário quase que exclusivo de todas as receitas decorrentes do aumento de arrecadação, seja ele decorrente da elevação da carga tributária ou da melhoria das condições macroeconômicas nacionais.

É bem verdade que essa transferência de renda da sociedade para o setor financeiro está há muito em andamento a partir da adoção da política de juros altíssimos, que não possui paralelo no mundo civilizado e nem se justifica pela inexistência de demanda aquecida, e é aliada à adoção de uma carga tributária que beneficia rentistas e proprietários em detrimento de consumidores e trabalhadores, o que também não encontra similar nos países do G-20, e à uma política de incentivos fiscais e financeiros a setores econômicos que não apresentam qualquer contrapartida especial para a sociedade.

Nesse contexto, a austeridade proposta é seletiva uma vez que, além de não oferecer qualquer revisão para os maiores ralos do dinheiro público no Brasil, ainda reserva todos os excepcionais benefícios do crescimento econômico ao setor financeiro, já que, se aprovada a emenda, todo ele terá como destinatário esse segmento, o que, historicamente, já se comprovou ser medida que não só promove grave elevação da desigualdade social, como compromete o desempenho da atividade industrial a partir do processo de financeirização da economia, conforme advertiu Stewart Lansley na obra The Cost of Inequality – Why Economic Equality is Essential for Recovery, ao analisar o fenômeno no Reino Unido, a partir da década de 1980.

Não é difícil perceber que a austeridade seletiva da PEC 241 não tem como objetivo o combate à crise fiscal conjuntural, mas a consagração de um projeto de transferência de renda para o topo, que não se esgota com a aprovação da PEC 241, passando também pelas reformas da previdência e trabalhista que pretendem promover medidas que acabarão por retirar riqueza das camadas mais desfavorecidas da nossa população.

Na verdade, os nossos problemas de desigualdade decorrem menos das forças de mercado do que das políticas públicas que se colocam por trás delas. Como afirma Simon Reid-Henry no livro The Political Origins of Inequality: why a more equal world is better for us, se isso é motivo de desespero é também de esperança: os nossos impasses atuais são mais sensíveis a mudanças do que somos encorajados a acreditar. A desigualdade é produto de normas arraigadas de um estatuto jurídico que desqualificam as reivindicações de alguns em detrimento de outros. A aprovação dessas normas na sociedade moderna é a história da luta entre as forças que buscam privatizar ganhos públicos e as que procuram consolidar uma sociedade forte.

Como descata Larry M. Bartels, na obra The New Gilded Age, se é evidente que a desigualdade econômica tem ramificações profundas para a política democrática, a política pode reforçar significativamente ou mitigar as pressões advindas de fatores como a mudança tecnológica, a globalização e as mudanças demográficas. Para o referido autor, a política partidária e as convicções ideológicas das elites políticas têm tido um impacto substancial sobre a situação econômica da classe média e dos pobres, sendo a desigualdade um fenômeno substancialmente político e ideológico.

Quando se fala em pressões dos mercados, é preciso lembrar que, como afirma Robert Reich, em Saving Capitalism – For The Many, Not The Few, os mercados são compostos por seres humanos, assim como as nações, os governos, as leis, as corporações são produtos dos seres humanos. E, a par do modelo atual, há muitas maneiras alternativas em que podem ser os mercados organizados. No entanto, uma vez organizado, as suas regras criam incentivos para as pessoas, motivando-as a trabalhar e a colaborar, e a serem produtivos e criativos. Ajudam as pessoas a obter a vida que eles procuram. As regras do mercado refletem os valores morais e julgamentos das pessoas sobre o que é bom e digno e o que é justo. Porém, tais regras não são inelásticas, mudando ao longo do tempo. Na verdade, a crescente desigualdade de riqueza e renda, não é decorrente apenas da globalização e avanço tecnológico. É muito mais fruto de mudanças que recompensam os mais bem-educados e articulados, punindo àqueles que não detém essas vantagens. Também é decorrente do lobby bem-sucedido pelas elites corporativas para a obtenção de impostos mais baixos, lacunas mais amplas, e os subsídios governamentais mais generosos.

A partir do exame da evolução da renda e do patrimônio em duas dezenas de países desenvolvidos e emergentes nos últimos dois séculos, Thomas Piketty, na festejada obra O Capital no Século XXI, constata que a desigualdade entre ricos e pobres tende sempre a aumentar na medida em que a taxa de rendimento do capital (r) torna-se maior do que a taxa de crescimento da renda e da produção nacionais (g). Sempre que r > g a desigualdade aumenta, pois, os patrimônios originados no passado se recapitalizam mais rapidamente do que a progressão da produção e dos salários.

Partindo dessa premissa, Shi-Ling Hsu , em The Rise and Rise of the One Percent: Considering Legal Causes of ealth Inequality, esclarece que há mecanismos nas regras jurídicas e instituições legais que fazem com que a taxa do retorno do capital (r na equação de Thomas Piketty) cresça mais do que o crescimento da economia (g), ou ainda que a primeira cresça mesmo que a último não avance. Ou seja, a lei tem sido muito mais eficaz em promover o aumento de r do que de g. Isso se dá porque os legisladores encontram grande facilidade em inflar r por meios de subsídios, tratamentos fiscais mais favoráveis e proteções legais contra a interferência regulatória, impulsionando o retorno a certos proprietários de capitais privados que mantém o poder suficiente para ter esse tipo de acesso ao Poder Legislativo.

Ademais, a influência da teoria do trickle-down – que sustenta estar o crescimento da economia intimamente ligado à riqueza dos mais ricos que, quanto mais possuem, mais investem, provocando redução de preços e maior consumo -, influencia sobremaneira os legisladores, dentro da perspectiva de que a adoção de medidas favoráveis aos mais ricos beneficiam a todos. Assim, a sociedade e os legisladores são fortemente inclinados a acreditar que o aumento retornos privados para o capital equivale a estimular o crescimento econômico em geral.
O direito, portanto, atua como uma força de divergência em duas fases: em primeiro lugar, contribuindo diretamente para a formação de capital privado, predominantemente em benefício dos mais ricos e, segundo, protegendo o capital de regulamentação ou da concorrência que poderia prejudicar a acumulação de capital.

Promover a formação de valorização do capital privado não contribui para a desigualdade de riqueza se ele também alavanca o crescimento econômico.
Feito corretamente, o capital privado deve sustentar o crescimento econômico. No entanto, as normas jurídicas e instituições que afetam a formação do capital, apesar da fundamentação de suas medidas sempre levar em conta o crescimento econômico e a criação de empregos, não têm sempre se preocupado com o tema na implementação de suas propostas. Ao contrário, muitas vezes, elas contribuem para a redução da atividade econômica, como na imposição das medidas de austeridade seletiva. Porém, por uma questão de opções políticas, as preferencias legais do capital são sempre mais fáceis de obter, como destaca Shi-Ling Hsu.

Para o vencedor do Prémio Nobel de Economia de 2001, Joseph Stiglitz, na obra O Preço da Desigualdade, o nosso sistema político funciona de forma a cada vez mais a aumentar a desigualdade de resultados e reduzir a igualdade de oportunidades conferindo excessivo poder aos que estão no topo às expensas do restante da sociedade, não só limitando a redistribuição, mas moldando as regras do jogo a seu favor, com a adoção de atividades de rent-seeking, assim entendidas como “a obtenção de rendimentos não como recompensa por ter criado riqueza mas por açambarcamento de uma fatia excessiva de riqueza que não se produziu. ” E explica o laureado economista norte-americano o contexto em que são desenvolvidas as atividades de rent-seeking: “Os ricos do topo aprenderam a extrair dinheiro dos outros com métodos que esses outros mal conhecem – é essa a sua verdadeira inovação. ”

As políticas de rent-seeking não só dirigem parcela significativa da renda para o topo, como acabam por destruir montantes expressivos dela, que são subtraídas de toda a sociedade por meio do processo de captação da riqueza pelos mais ricos, uma vez que, como explica Stiglitz no processo de tomar riqueza, há uma parte dela que é destruída.

De acordo com o liberalismo clássico preconizado por Adam Smith, o bom funcionamento do mercado é fruto do adequado alinhamento das compensações privadas e dos benefícios sociais, de forma que as pessoas com maior nível de produtividade (uma maior contribuição social) receberiam mais. Porém, como adverte Stiglitz, o próprio Adam Smith tinha a consciência de uma das circunstâncias em que os retornos privados e sociais se diferem. Como explicou o pai do liberalismo: “É raro que duas pessoas do mesmo ramo de negócios se encontrarem, ainda que num âmbito recreativo, sem que daí resulte uma conspiração contra o público, ou um acordo de subida de preços.” É que os mercados, por si só, não costumam obter resultados eficientes e desejáveis para toda a sociedade, o que confere justificativa para que o Estado corrigja as suas falhas a partir de políticas públicas que alinhem os incentivos privados e sociais. Assim, mesmo sob uma perspectiva liberal, o rent-seeking é nocivo, pois quando o Estado, ao revés de harmonizar os interesses do mercado com os da sociedade, agrava as contradições entre eles, estabelecendo políticas que privilegiam os primeiros em detrimento dos últimos, estará contribuindo para o mal funcionamento do próprio sistema econômico, com a criação daquilo que Karl Polanyi, na obra A Grande Transformação, designou por sociedade de mercardo.

Nestas circunstâncias, o subsídio ao capital aumenta o seu retorno sem contribuir para o crescimento econômico, protegendo os seus detentores mesmo quando estes se mostram ineficientes, criando uma inércia política que contribui com as forças de divergência entre as classes sociais, comprometendo o financiamento de políticas públicas que poderiam levar ao desenvolvimento social e nacional.

Como é imperioso reconhecer, o capital nem sempre é apenas um veículo para a ganância privada ineficiente para a sociedade. Como era fácil conceber no período pós-guerra, durante o predomínio das políticas keynesianas advindas do consenso de Bretton Woods, há muitas razões que unem o aumento do bem-estar social ao impulso ao retorno do capital privado. Como sustenta para Shi-Ling Hsu, em primeiro lugar, o capital e o trabalho são quase sempre complementares em certa medida. Ativado o capital, geralmente cria empregos.
Em segundo lugar, as incertezas políticas e regulatórias podem suprimir de forma ineficiente a formação do capital, sendo economicamente eficiente proteger o capital dos caprichos dos reguladores. Finalmente, a promoção governamental do capital pode desbloquear mercados críticos, que não receberiam o afluxo de recurso sem os estímulos, gerando o crescimento econômico.

Estas considerações políticas em favor da promoção do capital são
válidas, mas devem também ser levadas em consideração as externalidades latentes. Esta promoção e proteção do sistema jurídico ao capital tem o duplo efeito propulsor das desigualdades de riqueza. Incialmente as molduras jurídicas são concebidas de maneira a criar altos retornos de capital privado, sem contribuir necessariamente para o crescimento econômico. Uma vez que o capital é formado, ele cria um forte incentivo para resistir à qualquer reforma distributiva que possa ameaçar a sua acumulação pelos seus proprietários.

Por isso, é preciso ficar atento à advertência de Stiglitz quando diz que as políticas macroeconômicas têm sido limitadas pela ideologia fundamentalista dos mercados que serve os interesses dos que estão no topo, às custas do resto da sociedade, a partir das atividades de rent-seeking, que tanto contribuem para o aumento da desigualdade social.

Na América Latina, houve um grande incremento da desigualdade com a aplicação das políticas de austeridade ditadas pelo FMI e pelo Banco Mundial nos anos de 1990. A partir de 2000, começou-se a reverter esse quadro. No Brasil, em especial, a desigualdade tem recuado sensivelmente, atingindo os patamares verificados nos anos de 1960. Porém, como adverte François Borguignon, em The Globalization of Inequality, a desigualdade na América Latina ainda se encontra entre a pior do mundo, excepcionando alguns países do sul da África.

Como aponta Anthony Atkinson, em Desigualdade – O que pode ser feito?, não se deve estabelecer uma correção direta entre a redução da desigualdade na América Latina, entre 2000 e 2010, e o crescimento econômico, uma vez que a primeira caiu em países que vivenciaram crescimento econômico rápido, como Chile, Panamá e Peru, e em países com períodos de baixo crescimento, como Brasil e México. Também não há correlação automática entre a queda do índice Gini e a orientação política dos governos, uma vez que a desigualdade caiu sob o comando da centro-esquerda, como na Argentina, Bolívia, Brasil, Chile e Venezuela, bem como em países governados por partidos de centro-direita, como México e Peru. Facundo Alvaredo e Leonardo Gasparini, em Recent Trendes in Inequality and Poverty in Devoloping Countries, noticiam que as políticas de redução da desigualdade implementadas no continente latino-americano neste início de século têm em comum é combinação de mudanças nas rendas de mercado e a redistribuição expandida, por meio da redução da distância de salários dos trabalhadores mais e menos educados, da transferência governamental progressiva, do aumento substancial do salário mínimo e da expansão da assistência social.

No Brasil em especial, de acordo com a pesquisa de Ricardo Barros, Mirella de Carvalho, Samuel Franco e Rosane Mendonça, intitulada Markets, the State, and the Dynamics of Inequality in Brazil, desde 2000, a desigualdade de renda no Brasil vem diminuindo de forma constante e acentuada. Como consequência, a renda per capita dos 10 % da base da população tem aumentado a taxas muito altas, de 7% ao ano, bem acima da média nacional. Por sua vez, a pobreza extrema tem diminuído em três vezes o ritmo necessário para cumprir o primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, e mais da metade do declínio veio de reduções na desigualdade de renda. Identificam os referidos autores como fatores responsáveis ​​para o declínio recente da desigualdade o aumento das transferências governamentais contributivas e não contributivas; o declínio nas diferenças salariais por nível educacional e reduções na desigualdade na educação causada pela expansão acelerada do nível educacional da força de trabalho; e a melhoria na integração espacial e setorial dos mercados de trabalho, em particular entre as áreas metropolitanas e não-metropolitanas.

Contudo, em nosso país, o absenteísmo estatal advindo da eventual aprovação da PEC 241, levará a uma rápida reversão do quadro, agravando o triste cenário de desigualdade que sempre assolou o nosso país, com a transferência de renda para o topo da pirâmide, a partir da lógica condenada por Zygmunt Bauman, na obra A Riqueza de poucos beneficia todos nós?: “Há um fabuloso crescimento econômico das fortunas da parcela de 1% dos mais ricos, para piorar o que já é péssimo, num período de austeridade sem paralelo para a maioria dos 99% remanescentes. (…) O quadro geral deixa pouco ou nenhum espaço a dúvida: como hoje se apresentam as coisas, o crescimento econômico não pressagia, para a maioria de nós, a chegada de um futuro melhor. ”

Como se vê, a austeridade, tal como é preconizada aqui e alhures, ainda que sob a roupagem inodora da responsabilidade fiscal, tem ideologia e compromisso com a transferência de renda da base para o topo da pirâmide social. Assim, longe de ser uma alternativa como propõe o título desse artigo, a PEC 241 não só estabelece uma austeridade seletiva, como, e por isso, se destina às atividades de rent-seeking, promovendo a transferência de riqueza dos mais pobres para os mais ricos. Por isso, é a PEC da desigualdade!

Ricardo Lodi Ribeiro (RJ)
Mestre em Direito Tributário pela UCAM. Doutor em Direito e Economia pela UGF. Professor Adjunto de Direito Financeiro da UERJ. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito. Presidente da Sociedade Brasileira de Direito Tributário (SBDT)